Apresentado oficialmente como novo técnico do Atlético-MG, Cuca iniciou a entrevista coletiva nesta segunda-feira (13) com um pronunciamento sobre o caso em que foi acusado de estupro de uma menor de idade, na Suíça, em 1987. À época, ele era jogador do Grêmio e foi acusado, junto com outros três jogadores, de manter relações sexuais com uma garota de apenas 13 anos. Ele chegou a ser condenado pela Justiça da Suíça, mas a sentença foi anulada no início do ano passado. "Eu gostaria de começar essa minha entrevista falando a respeito da minha apresentação lá no Athlético-PR. Eu sei que é um tema que certamente vai vir à tona, e com todo direito. É um tema muito sensível, delicado e muito importante, que é o tema lá do caso da Suíça. Eu, quando li aquela carta no Athlético-PR, me prontifiquei dentro de mim a tentar ser uma pessoa melhor, a ser um homem melhor e eu confesso para vocês que tenho aprendido muita coisa com muita gente, escutado muita gente, escutado minha família, minha família é quase toda feminina", declarou Cuca.
Cuca reconheceu que errou ao deixar o tema de lado. Segundo ele, apenas recentemente entendeu o que chamou de seus "defeitos", e que a questão vai muito além disso.
"Eu, quando demorei tanto tempo para falar daquele tema, e hoje eu abro falando dele, é porque hoje eu consigo falar, eu consigo ver os meus defeitos, eu consigo entender que eu tentava falar do Cuca, explicar o Cuca. E não era isso que a sociedade queria, a sociedade queria saber do tema, da causa, do que eu como homem podia fazer pela causa, pelo tema", sustentou o treinador do Atlético-MG. "Tenho trabalhado incessantemente desde aquele dia em busca de ser uma pessoa melhor, de ser uma pessoa que entenda mais o tema, não só pelas minhas filhas, pelas minhas netas, pela minha mãe, pela minha irmã, mas pelas mulheres, pelo respeito que as mulheres têm e merecem, pela igualdade que a gente busca e eu estou aliado a isso", acrescentou Cuca.
O treinador do Atlético-MG reconheceu que o futebol ainda envolve muito machismo, mas em sua avaliação está avançando de forma positiva nesse aspecto.
"A gente vive muito num mundo machista, o futebol ainda é um mundo machista. Hoje, se a gente olhar o auditório aqui (onde acontecia a entrevista), ele tem 70%, 80% de masculino. Mas já foi pior, um tempo atrás foi muito pior", pontuou o treinador.
"Hoje, olhando o treino das meninas, eu vi o quanto que evoluiu o futebol feminino, coisa que eu não conseguia ver antes. Vi o quanto as meninas têm que lutar mais do que a gente, o homem, para poder vencer. A começar pelo horário, elas começam o treino às 7h30, tem que acordar às 6h30, às 5h da manhã, estar às 6h30 no campo para tomar um café e depois vir para o treino. E essas coisas eu prometi, e tenho feito, dentro do possível, com ações, no meu instituto, onde eu tenho três núcleos em Curitiba e quero transportar aqui para o Galo, que tem também o Instituto Galo", complementou.
No Athlético Cuca se manifestou
Quando Cuca estreou no comando do Athletico-PR em março de 2024 com goleada de 6 a 0 sobre o Londrina nas quartas de final do Campeonato Paranaense, após a partida ele também usou a coletiva de imprensa para se pronunciar sobre a condenação por ato sexual com menor e coação, que foi anulada recentemente pelo Tribunal Regional de Berna-Mittelland, na Suíça.
Leia a íntegra decomunicado feito por Cuca no dia dia 11/03/2024:
"Confesso para vocês que estou nervoso. É um tema muito sério, muito importante.
Escrevi para não correr o risco de errar, porque não sou bom com palavras, sou muito "boleirão". Queria falar sobre os últimos meses que eu tenho vivido. Há quase um ano eu sai do Corinthians e vocês podem imaginar o que estou passando e o quanto estou refletindo. Antes de falar, precisei escutar minha esposa, minhas filhas. Escrevi esse texto com a ajuda delas. Porque ainda não me sinto com conhecimento suficiente para falar sobre algo tão forte. Por elas e por todas eu escrevi e não quero errar.
Tenho escutado as opiniões e tentado entender o meu papel. No começo do ano li uma coluna da Milly Lacombe, da UOL, em que ela disse que isso não era sobre mim. Eu entendi o que ela quis dizer. Não é SÓ sobre mim, mas é sobre mim também. Eu escolhi me recolher durante muito tempo, mas consegui seguir a minha vida, enquanto uma mulher que passa por qualquer tipo de violência não consegue seguir a vida dela sem permanecer machucada, carrega o impacto para sempre. Eu consegui seguir minha vida. O mundo do futebol e o mundo dos homens nunca tinha me cobrado nada, mas o mundo está mudando e eu acho que é para melhor.
Não adianta eu ser um grande treinador, esposo, pai, avô, irmão, se eu não entender que o mundo é mais do que o futebol e que eu faço parte dessas coisas. Eu enxergava os problemas, mas me calei porque a sociedade permitia que eu, como homem, me calasse. Hoje entendo que o silêncio soa como covardia. Tenho buscado ouvir mais, entender mais, aprender mais.
Não posso mudar o passado. Muitos homens agora me escutam e são capazes de olhar para o passado para rever suas atitudes. Sabemos que o mundo é um lugar diferente para os homens e mulheres, e quando enxergamos isso podemos até resistir, mas as coisas começam a mudar. Só que mudanças honestas e verdadeiras levam tempo, exigem dedicação, estudo, são dolorosas e desafiadoras.
A realidade tem que ser transformada para que o mundo seja um lugar mais seguro para as mulheres. O mundo do futebol ainda é um mundo de muito preconceito. Entendi que quando me cobram não é só sobre mim, é sobre a forma como tratamos as mulheres. Não estou falando isso como fala isolada para agradar alguém, ou da boca para fora. Se fosse assim teria me manifestado antes. Falo isso de coração.
Quero e me comprometo a fazer parte da transformação. Vou fazer isso com o poder da educação. Quero ajudar. Quero jogar luz, usar a voz que tenho para, ao mesmo tempo que me educo, educar também outros homens, principalmente os jovens que amam futebol. Sucesso repentino é desafio. Muitos se perdem pelo caminho com fama e dinheiro. Somos levados a acreditar que podemos tudo, inclusive desrespeitar as mulheres. Precisamos dar aos mais novos a oportunidade de não errarem como tantos de nós erramos. É ali que podemos sensibilizar, colocar para pensar, orientar. Sucesso, dinheiro e fama não servem para nada se você se perder no caminho.
Eu pensei que eu estava livre da minha angústia quando solucionei meu problema com a anulação do processo e a indenização. Mas entendi que não acabou porque não dependia apenas da decisão judicial, mas que eu precisava entender o que a sociedade esperava de mim. O que vocês vão ver de mim daqui para frente não serão palavras, serão atitudes. Mas obrigado por me ouvirem hoje."
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